TikTok Shop mudou o jogo no varejo? Rede social entra de vez no mundo das compras

No final do anos 1980, “They Live” levou aos cinemas um par de óculos mágicos que revelava mensagens ocultas como “consuma” e “compre”, estampadas em outdoors. Hoje, sem precisar de lentes especiais para vislumbrar a influência, basta abrir o TikTok para mergulhar em uma vitrine de rolagem infinita com produtos e sugestões sob medida, onde vídeos leves e envolventes podem se transformar em gatilhos quase imediatos para o consumo.

O TikTok Shop desembarcou no Brasil em 8 de maio, sob a perspectiva de que as redes sociais vão deixar de somente influenciar para, agora, vender diretamente aos consumidores. A proposta é o chamado “social commerce”, modelo de vendas em que toda a jornada de compra ocorre dentro da própria rede social.

Ao InfoMoney, a plataforma destaca que um dos diferenciais está na dinâmica de descoberta dos produtos. De forma espontânea, os usuários se deparam com itens de seu interesse e, ao invés de buscar por algo específico, são impactados por recomendações enquanto consomem conteúdo. Assim, o entretenimento é transformado em vitrine — e a curiosidade, em conversão.

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“Para os compradores, a experiência é fluida e nativa. Para os vendedores, especialmente as PMEs, a plataforma oferece uma oportunidade única de alcançar um público engajado sem a necessidade de uma base de seguidores prévia, pois o conteúdo autêntico é o que gera conexão.”

— TikTok Brasil

Na avaliação do TikTok, o público brasileiro está mais do que preparado para o e-commerce que une entretenimento e compra. Isso porque, segundo a plataforma, 91% dos usuários tomam alguma ação após uma pesquisa feita no app e 84% dessas buscas refletem fases de exploração e avaliação.

Ao zapear pela rede social, é possível encontrar mais de mil marcas que aderiram à funcionalidade no Brasil. Além de nomes que são nativamente digitais, como Boca Rosa Beauty e Salon Line, estão empresas conhecidas pelos mais variados perfis de públicos, como Natura (NTCO3), Boticário, L’Oréal, Stanley, C&A (CEAB3) e Riachuelo (GUAR3).

Apesar de não divulgar números de vendas, a plataforma já colhe sinais de tráfego e engajamento significativos. Um levantamento da Winnin Intelligence mostra que o TikTok Shop atingiu um pico de relevância de 4,01 milhões visualizações em maio, superando com folga o desempenho do rival que oferece a modalidade desde o final do ano passado.

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Ao todo, mais de 10 mil vídeos foram publicados com a tag da funcionalidade, gerando 7,2 milhões de interações. Em comparação, o Kwai Shop somou apenas 144 vídeos e 16 mil de engajamento. “O TikTok Shop já se consolidou como protagonista do e-commerce por vídeo no Brasil. E isso muda o jogo para marcas”, aponta a análise da Winnin.

Potencial bilionário no mercado brasileiro

Com 111 milhões de usuários no Brasil, o TikTok tem aqui o seu terceiro maior mercado, atrás apenas da Indonésia e dos Estados Unidos. Em um relatório do Santander, os analistas Ruben Couto, Eric Huang e Vitor Fuziharo projetam que o TikTok Shop pode responder por 9% do e-commerce brasileiro até 2028, representando um GMV (Volume Bruto de Mercadoria) entre R$ 25 bilhões e R$ 39 bilhões.

Para abocanhar esse montante, a plataforma já vem implementando um ecossistema robusto. Além de integração com meios de pagamento confiáveis e logística gerida via Correios e transportadoras parceiras, a rede social diz oferecer suporte aos vendedores por meio da TikTok Shop Academy, Central do Vendedor e programa Seller Mission. De olho nos pequenos vendedores, também há isenção de taxas nos primeiros 90 dias e frete gratuito.

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Na frente de publicidade, a Inteligência Artificial é usada para integrar criativos (combinação de diferentes elementos criativos, como imagens, vídeos e textos) em escala e maximizar resultados. A rede social ainda conta com o programa de afiliados, permitindo que influenciadores e criadores de conteúdo monetizem ao promover produtos, criando uma cadeia de venda descentralizada e com potencial viral.

Na percepção dos analistas, o TikTok Shop representa uma oportunidade e um desafio para as marcas brasileiras. O Santander analisou 28 empresas listadas na B3 (B3SA3) e concluiu que apenas 18% já adotam estratégias nativas de plataforma, capazes de produzir maior engajamento e menor custo de aquisição de clientes.

Para eles, entre as mais preparadas estão Natura, Boticário e Burger King (ZAMP3), enquanto varejistas tradicionais como Guararapes (dona da Riachuelo) e Vulcabras (VULC3) enfrentam maior risco de perda de mercado. “Marcas e varejistas não podem se dar ao luxo de não dominar o TikTok (…) Pode ser a maior disrupção do varejo desde a pandemia”, alertam os analistas do Santander.

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Psicologia da decisão

Nos EUA, onde o TikTok Shop está ativo desde setembro de 2023, os resultados ajudam a dimensionar o impacto do social commerce. Uma pesquisa da plataforma YouGov, publicada no último mês de maio, mostra que 30% dos usuários adultos da plataforma fizeram ao menos uma compra nos últimos 12 meses, sendo que 41% dos consumidores entre 35 e 54 anos são os mais ativos.

Por lá, as categorias favoritas são moda, eletrônicos, produtos para o lar e cosméticos. Só que reforçar que o sucesso não está apenas no produto, mas na forma como ele é apresentado aos usuários.

“O processo de tomada de decisão dos consumidores é muito menos racional do que parece”, explica Robson Gonçalves, coordenador do curso de Neuromarketing e economista comportamental da Fundação Getulio Vargas (FGV). Ele ainda destaca que a nova funcionalidade aposta na chamada “arquitetura da escolha” (ou nudge).

Um contexto fluido que dá um “empurrãozinho” para que a compra seja feita no momento exato do pico de dopamina gerado pela expectativa de recompensa, antes mesmo que o impulso vá embora. Inclusive, essa intervenção comportamental não é exatamente uma novidade no universo do marketing digital.

A exemplo disso, a Amazon criou a compra com um clique, encurtando o caminho do comprador até a aquisição. Agora, o TikTok Shop vai além e está eliminando “atritos” ao concluir toda a jornada dentro da próprio rede social.

Ainda nessa esteira de compras, Gonçalves aponta para outro estímulo que esse ambiente pode provocar no usuário: a “transferência da excitação”. Ela ocorre quando o estado emocional provocado por uma atividade — como assistir a vídeos curtos ou lives no TikTok — se transfere para outra ação que ocorre em seguida, como a decisão de compra.

Isso porque o consumidor está em um momento de prazer e descontração, e essa emoção é projetada no produto apresentado na tela. “A pessoa está entretida, leve e receptiva, e esse clima favorece a vontade e a concretização da compra.”

Algoritmos e compras saudáveis

Mas tamanha eficiência também levanta alertas dos especialistas. “A pessoa não compra mais o que quer, mas o que o algoritmo entende que é ideal para ela. Isso desumaniza o consumo”, aponta Gonçalves.

Ana Paula Hornos, educadora financeira e psicóloga, ainda destaca que a diferença emocional entre comprar em uma plataforma como o TikTok e em um e-commerce tradicional é grande. “A rede social mistura lazer com consumo. O consumidor se sente entre amigos, o que reduz o senso crítico e aumenta a impulsividade.”

Segundo ela, isso potencializa o risco de compras por impulso, movidas pela busca por um alívio momentâneo. A recomendação é deixar o item no carrinho por pelo menos 24 horas antes de concluir a compra e refletir sobre a necessidade da aquisição.

Para quem teme entrar em um comportamento compulsivo, alguns sinais de alerta incluem:

– comprar itens que não estavam no planejamento e sentir culpa logo depois;
– perceber que as compras são feitas para aliviar emoções como ansiedade, tristeza ou tédio;
– aumentar o volume ou a frequência de compras para sentir o mesmo nível de satisfação (como se fosse uma dose maior para o mesmo efeito);
– esconder as compras da família ou dos amigos;
– comprometer o orçamento, deixando de pagar contas ou acumulando dívidas.

Uma compra saudável, por outro lado, é intencional e consciente. Nele, o consumidor sabe o motivo da aquisição, verifica se o produto cabe no orçamento e, principalmente, se está alinhado com as prioridades. “O prazer disso não vem para tapar um vazio emocional, mas para atender a uma necessidade real ou proporcionar uma experiência significativa”, diz Hornos.

Fonte: Info Money

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