Saúde baseada em valor ainda é exceção no Brasil, mas estudo aponta mudança de rota até 2030 

A lenta adoção de modelos de Value-Based Health Care (VBHC) na saúde suplementar brasileira ganha um retrato inédito em estudo elaborado pela L.E.K. Consulting em parceria com o Instituto Brasileiro de Valor em Saúde (Ibravs). 

Embora 60% dos executivos entrevistados reconheçam a relevância do conceito para a sustentabilidade do setor, apenas cerca de 10% dos hospitais têm algum contrato efetivamente baseado em valor.  

A mesma proporção se aplica aos acordos de capitation + valor, modalidade em que o pagamento é per capita, com foco em prevenção e desfechos. Os resultados foram divulgados recentemente durante o CLAVS’25, no Rio de Janeiro. 

O levantamento mostra que 75% dos hospitais já trabalham com modelos de preço fixo — sobretudo pacotes — que em 2024 concentraram 13,2% de todos os gastos assistenciais. Contudo, apenas 7% adotam o modelo Diagnosis-Related Group (DRG) + valor, considerado mais avançado por incluir desfechos do paciente. 

 “Há uma confusão frequente entre pacote e VBHC. Empacotar não é necessariamente entregar valor; é somente transferir risco do pagador para o prestador”, observa César Abicalaffe, presidente do Ibravs. 

Barreiras estruturais e culturais 

A pesquisa também mapeia entraves conhecidos: ausência de confiança entre operadoras e hospitais, falta de dados integrados e resistência cultural. Médicos tendem a associar o modelo à perda de autonomia, enquanto operadoras receiam investir em prevenção sem garantia de fidelização dos beneficiários.  

“Ainda predomina a ideia de que um ganha e o outro perde, quando o verdadeiro beneficiário deveria ser o paciente”, avalia Abicalaffe. 

A fragmentação do cuidado é outro desafio central. Cirurgia em um hospital, reabilitação em outra clínica e acompanhamento em um terceiro local ainda ocorrem sem integração de prontuários ou indicadores de desfecho.  

“Sem dados confiáveis e compartilhados, é impossível remunerar pelo que realmente importa: o resultado clínico”, reforça o presidente do Ibravs. 

Apesar das barreiras, há expectativa de avanço. Segundo o estudo, 67% dos provedores pretendem ampliar o uso de modelos baseados em performance ou população até 2025, e 78% projetam crescimento até 2030.  

Para Abicalaffe, a transição é irreversível: “O fee-for-service está esgotado. O aumento do sinistro e a pressão por qualidade e sustentabilidade criam a tempestade perfeita para quebrar o ciclo do pagamento por volume”. 

Papel do regulador 

O estudo ressalta ainda a importância de estímulos regulatórios e governamentais. Experiências internacionais, como as Accountable Care Organizations (ACOs) nos Estados Unidos, mostram como políticas públicas podem acelerar a mudança.  

No Brasil, a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) vem testando iniciativas como o Projeto Parto Adequado e o OncoRede, mas de forma limitada. “Precisamos de um marco regulatório que premie de fato o desfecho e a pertinência clínica”, defende Abicalaffe. 

Caminhos futuros 

O VBHC é amplamente reconhecida, mas pouco monetizada. O desafio está em transformar discurso em prática. “O futuro da saúde depende da capacidade de remunerar pelo que realmente importa: mais saúde com melhor custo. Esse é o norte que deve guiar o setor nos próximos anos”, resume o presidente do Ibravs. 

Fonte: Saúde Business

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