A adoção da inteligência artificial (IA) nas instituições de saúde e seu impacto na relação com o paciente foi um dos temas centrais discutidos no primeiro dia do Universo Totvs 2025, realizado no Expo Center Norte, nos dias 17 e 18 de junho.
Moderada por Rogério Pires, diretor de Produto de Saúde da Totvs, a conversa contou com Leandro Firme, CEO da Unimed Porto Alegre; Daniel Knupp Augusto, líder médico da Alice; e Aline Conto, gerente executiva de Sistema de Gestão Integrado da Círculo Saúde. Todos compartilharam experiências práticas sobre como a IA vem sendo incorporada para apoiar diagnósticos, integrar jornadas de cuidado, agilizar atendimentos e aumentar a eficiência — tudo isso sem abrir mão da humanização.
Quanto aos benefícios da IA, Firme destacou os avanços operacionais, Knupp trouxe a perspectiva de uma operadora nativa digital, enquanto Aline focou na coordenação do cuidado. Com perfis e contextos distintos, os executivos foram unânimes ao defender que a tecnologia deve ser usada como ferramenta de apoio — e não como substituição do vínculo humano no cuidado.
Eficiência e foco no cuidado
Knupp apresentou um conjunto de iniciativas integradas à atenção primária que combinam saúde digital e medicina de família, com foco na eficiência e na qualidade do cuidado. Um dos destaques foi a ferramenta de triagem com IA, que interage com o paciente e o direciona para o time mais adequado. “É a busca pelo melhor cuidado, no menor tempo possível”, explicou o líder médico.
Ao refletir sobre a jornada digital da Alice, Knupp destacou o amadurecimento do modelo híbrido. “No mesmo tempo que a operadora nasce digital, tudo foi excessivamente digital, até pelo contexto da pandemia. Hoje a gente deu passos atrás na digitalização, integrando mais o modelo tradicional de cuidado”, afirmou.
Essa mudança foi motivada por aprendizados práticos na busca por mais eficiência, sem abrir mão da qualidade assistencial. “A gente foi entender que, para ter a eficiência que gostaria como sistema de saúde, era importante oferecer também o cuidado presencial. O ganho de eficiência também está nisso”, pontuou.
O líder médico também compartilhou os resultados do uso da IA no pronto-atendimento digital da Alice. “A gente conseguiu reduzir o tempo de consulta de 15 para 12 minutos, sem impactar na experiência dos nossos pacientes”, ressaltou. A automação do registro clínico, com transcrição de áudio por IA, trouxe ganhos adicionais. “Só com a possibilidade de registrar a consulta usando IA para transcrever o áudio, tivemos um ganho de três minutos por consulta, mantendo a mesma qualidade”, explicou.
Apesar dos avanços, Knupp faz um alerta sobre os cuidados no uso da tecnologia e defende seu uso responsável como ferramenta complementar. “O ideal é a IA atuar como um copiloto: ajudando a validar hipóteses, apoiar diagnósticos e ampliar a capacidade do profissional, sem substituir sua experiência”, pontua.
Resgate da essência humana
Leandro Firme trouxe outro olhar sobre a tecnologia. “Nunca antes na saúde se falou tanto em resgatar o relacional. Vivemos mais uma revolução humana do que tecnológica”, afirmou. O CEO destacou que a inteligência artificial tem o potencial de antecipar eventos clínicos, apoiar estratégias preditivas e, principalmente, integrar informações que hoje são fragmentadas. “Precisamos enxergar o paciente de forma integral, gerar saúde — e não apenas tratar doenças”, enfatizou.

Firme compartilhou como a adoção da IA vem impactando diretamente a operação da Unimed Porto Alegre. “No início, focamos muito em ganhos de produtividade e eficiência. Um exemplo é o processo de autorizações, que garante acesso dos nossos clientes à rede credenciada e aos serviços de saúde”, relatou.
O executivo explicou que a automação já fazia parte da operação, mas os avanços se intensificaram com a inteligência artificial. “Antes da adoção da IA, trabalhávamos com processos automatizados, mas ainda dentro dos prazos regulatórios — que podem chegar até 20 dias. Com a IA, reduzimos esse tempo para meio dia. Em alguns casos, a resposta é instantânea”, afirmou.
O impacto é expressivo tanto em escala quanto em qualidade. “Estamos falando de um universo de quase 13 milhões de pessoas, com mil guias por dia geradas para uma carteira de mais de 660 mil clientes. É um volume gigantesco, e a IA trouxe um ganho de eficiência significativo.”
Em situações de intercâmbio entre diferentes Unimeds, os resultados são ainda mais evidentes: “Saímos de autorizações que levavam dias para decisões instantâneas. Isso garante ao cliente um acesso mais rápido, mais seguro e com maior qualidade.”
Coordenação do cuidado e redução de desperdícios
Aline Conto reforçou como a IA pode ser uma aliada no enfrentamento de um dos maiores desafios do sistema: a descoordenação do cuidado. “Hoje o paciente se perde na rede. A IA pode ser essa bússola, orientando cada passo da jornada: da consulta ao exame, passando pelas linhas de cuidado mais adequadas.”
A executiva da Círculo Saúde citou o uso de IA na predição de sinistros e a importância de uma visão sistêmica. “Estamos condenados à eficiência operacional — como Fernando Torelly diz — e a IA é chave para esse processo”, argumentou.

Integração de dados: ainda um grande obstáculo
A interoperabilidade também esteve em pauta. Firme analisou que o modelo atual da saúde suplementar ainda é centrado na produção, e não na saúde do paciente. “Enquanto não superarmos a mentalidade de que o dado pertence ao paciente e não à instituição, vamos continuar enxugando gelo.” Para avançar, defende acordos com parceiros e uma postura mais aberta para redistribuir os ganhos gerados pela eficiência.
Aline destacou que, mesmo dentro das instituições, integrar dados já é um desafio — o que dirá entre diferentes players. Ela vê na remuneração por valor uma possível alavanca para mudar essa lógica e revelou um desejo: “Imagino um aplicativo em que o paciente veja sua jornada, receba alertas de wearables e tenha tudo orquestrado por inteligência artificial.”
O futuro com mais integração, valor e sabedoria
Para Knupp, o futuro da saúde passa, inevitavelmente, por uma atenção primária fortalecida e por modelos de cuidado baseados em valor. “O sistema fragmentado não se sustenta”, afirmou, reforçando a necessidade de redes integradas e centradas no paciente.
Firme complementa essa visão com um alerta e uma esperança. Embora reconheça o potencial exponencial da inteligência artificial, ele destaca que o verdadeiro impacto virá das escolhas que forem feitas a partir de agora. “É preciso fazer boas escolhas para gerar valor não só aos negócios, mas principalmente aos pacientes.”
Em um cenário cada vez mais orientado por dados, eficiência e inovação, os líderes concordam: a tecnologia será essencial — mas continuará sendo o fator humano, guiado por propósito e sabedoria, o que realmente fará a diferença.