Governos em todo o mundo não têm tratado bem suas moedas nos últimos tempos. Esse descuido elevou o nível de endividamento em vários países e enfraqueceu divisas, abrindo espaço para o avanço de formas digitais de dinheiro.
Essa foi a avaliação do economista Roberto Campos Neto, ex-presidente do Banco Central do Brasil, no segundo dia do Digital Assets Conference 2025 (DAC), evento promovido pelo Mercado Bitcoin na terça-feira (23), em São Paulo.
“Não dá para dizer que os governos em geral estão tratando muito bem as moedas nos últimos tempos. A gente está com um nível de dívida muito elevada em vários lugares, e há uma percepção de falta de habilidade ou de falta de condições dos governos de fazerem as dívidas em vários lugares do mundo, incluindo os Estados Unidos, convergir”.
Segundo Campos Neto, esse cenário aponta para a necessidade crescente de dinheiro programável. “A gente está saindo do mundo de accounts e indo para o mundo de tokens“.
Além do quadro global, o ex-presidente do BC destacou que mudança de percepção dos governos em relação às ativos e o avanço de regulações mais “cripto-friendly”, especialmente nos Estados Unidos, também impulsionam o segmento cripto. Em julho, o Senado americano aprovou a Genis Act, marco regulatório histórico voltado a stablecoins — criptomoedas lastreadas em ativos como dólar, real ou ouro.
“Os Estados Unidos sempre são uma liderança nesse sentido e a gente tinha uma regulamentação lá, até um tempo atrás, que inibia e afastava o setor bancário tradicional do setor de ativos digitais. Eu acho que esse afastamento diminuía a intensidade e o desejo das pessoas a investirem. Isso foi revertido, em parte”, falou.
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Presente para a dívida
Campos Neto também ressaltou a importância das stablecoins para o Tesouro americano. Quase 99% das stablecoins são em dólar, e como cada unidade emitida precisa ter lastro equivalente em dinheiro ou títulos públicos, os emissores se tornaram grandes compradores de papéis do governo.
A Tether, responsável pela USDT – maior stablecoin do mundo -, mantém US$ 127 bilhões em treasuries, mais do que países como Alemanha e Coreia do Sul.
“Se estivesse sentado na cadeia do Tesouro (dos EUA) eu ia estar muito feliz de ter uma demanda para meus títulos dessa natureza. Os holders (titulares) de stablecoins já são acho que o quinto ou sexto maior holder de treasuries e crescem em um ritmo muito acelerado, enquanto os outros não crescem ou diminuem. Então em breve os maiores holders de treasuries serão stablecoins”.
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No Brasil também acontece um momento parecido com as stablecoins atreladas ao real. Hoje, das cinco existentes – BRZ, BRLA, cREAL, BBRL e BRL1 -, quatro mantêm parte do lastro em títulos públicos. Apenas no ano passado, segundo estudo divulgado recentemente pela Iporanga Ventures, elas movimentaram R$ 5 bilhões.
Fonte: Info Money