A judicialização da saúde no Brasil está ganhando novos contornos com decisões recentes do Supremo Tribunal Federal (STF) que estabelecem critérios mais rigorosos para o fornecimento de medicamentos e tecnologias não incorporadas ao Sistema Único de Saúde (SUS) e ao rol da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS). A análise foi apresentada por Renata Rothbarth, sócia da Machado Meyer Advogados, no palco Saúde Privada durante o HIS – Healthcare Innovation Show 2025.
Segundo Rothbarth, os julgamentos ocorridos em setembro de 2024 e setembro de 2025 representam uma mudança de paradigma. “A judicialização do que não está incorporado no SUS só pode ser fornecida em caráter excepcional, não é a regra e sim a exceção”, afirmou. Essa nova diretriz rompe com a interpretação ampla do direito à saúde que prevalecia até então.
Seis requisitos para acesso judicial a medicamentos
O chamado Tema 6, relatado pelo ministro Luiz Roberto Barroso, estabelece seis requisitos cumulativos que devem ser comprovados pelo autor da ação para obter judicialmente um medicamento não incorporado ao SUS. Entre eles estão:
- Negativa administrativa de acesso;
- Ilegalidade ou omissão da Conitec;
- Ausência de substituição terapêutica;
- Comprovação de eficácia com evidência científica de alto nível;
- Imprescindibilidade clínica;
- Incapacidade financeira do paciente.
Rothbarth alerta para os impactos dessa nova exigência: “Pode ser que a gente deixe de conceder medicamentos que cumprem todos os cinco requisitos, mas não cumprem o sexto por razões que fogem ao controle do paciente, da agência, da própria indústria ou qualquer outra entidade”.
Taxatividade mitigada no rol da ANS
Já o julgamento da ADI 7265, ocorrido em setembro de 2025, trouxe à tona a discussão sobre a natureza do rol da ANS. O STF definiu que o rol tem caráter de “taxatividade mitigada”, ou seja, tecnologias não listadas podem ser cobertas desde que cumpram cinco requisitos específicos. A decisão impacta diretamente as operadoras de planos de saúde, que agora devem considerar esses critérios antes de negar cobertura.
Os cinco requisitos definidos pela ADI 7265 são:
- Existência de prescrição médica ou odontológica;
- Inexistência de negativa da ANS ou pendência de avaliação de incorporação;
- Ausência de alternativa terapêutica disponível no rol da ANS;
- Comprovação de eficácia, qualidade e segurança com evidência científica de alto nível;
- Existência de registro na Anvisa, quando aplicável.
“Os cinco requisitos são limitadores no sentido de que passamos a criar um padrão do que precisa ser analisado tanto pelas operadoras quanto pelos juízes”, explicou Rothbarth. Ela também destacou que, diferentemente do tema 6, a ADI 7265 permite a inversão do ônus da prova, cabendo às operadoras justificar a negativa de cobertura.
Dados revelam complexidade do cenário
O mapeamento realizado pelo escritório mostra que, após a aplicação dos novos critérios, houve uma taxa de interrupção de tratamentos já concedidos entre 18% e 20%. Além disso, cerca de 70% dos medicamentos judicializados custam menos de mil reais, e 45% dos processos envolvem tecnologias já incorporadas ao SUS.
“Será que o problema da judicialização é efetivamente o que está fora do rol ou será que o que a gente incorporou no rol não está sendo comprado, não está sendo disponibilizado?”, questiona Rothbarth, apontando para falhas operacionais que obrigam o paciente a recorrer à Justiça para obter acesso ao que já deveria estar disponível.
Futuro incerto e necessidade de dados
Apesar dos avanços, Rothbarth acredita que os novos critérios não resolverão o problema da judicialização. “A gente ainda vai ter um alto grau de subjetividade em relação a determinados critérios”, afirmou. Ela defende que o debate seja pautado por dados concretos e não por estigmas. “Não é sobre o paciente que pede um Uno e quer levar uma Ferrari. É sobre entender se todos estão cumprindo seu papel e onde estão os pain points do sistema.”
Ainda dá tempo de participar! Acesse o site do HIS e faça seu credenciamento, o evento vai até amanhã, dia 02 de outubro.
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