Como esta fazenda se tornou exemplo na produção de leite de baixo carbono da Danone

Bloomberg Línea — A depender do momento em que se chega ao “berçário” da Fazenda Santa Rosa, em Ilicínea, no sul de Minas Gerais, é possível ouvir uma melodia suave se misturar ao mugido das bezerras.

A música clássica, transmitida por uma pequena caixa de som entre o meio-dia e as 14h30, ao lado das fichas de identificação de cada animal, faz parte de um ambiente planejado para o conforto e o bem-estar. O cuidado se reflete em maior produtividade na produção de leite destinada à gigante global de alimentos Danone.

As jovens vacas também recebem “massagem” com escovas e contam com capas de proteção contra o frio e a chuva.

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“Nós costumamos dizer que aqui elas têm uma rotina de spa”, disse Rejane Maria, que comanda a propriedade ao lado do marido, Naisser Pinheiro, em entrevista à Bloomberg Línea.

As práticas de bem-estar “à la spa” foram idealizadas por Rejane, que cresceu ouvindo música clássica e acreditava que as melodias ajudariam a acalmar as bezerras.

A produtora contou que deixou de trabalhar em um comércio farmacêutico que administrava para se dedicar à pecuária leiteira ao lado do marido e, em poucos anos, transformou uma fazenda de nove vacas em um negócio referência na rede de produtores da Danone no Brasil.

Hoje, a propriedade abriga 160 vacas em lactação que produzem cerca de 6.000 litros por dia.

“A cultura de Minas é leite e café, mas muitos ainda têm preconceito em reconhecer a fazenda como um negócio que é rentável e pode dar dinheiro”, disse Henrique Volpe, técnico que acompanha 11 propriedades parceiras da Danone na região.

Atualmente, 20% do leite fresco processado pela empresa é considerado de origem de baixo carbono.

O ciclo de produção de leite está diretamente ligado à gestação das vacas, que dura cerca de 284 dias. Ou seja, cada uma tem um parto por ano.

O pico de lactação ocorre aproximadamente 60 dias após o parto, explicou Volpe. Durante esse período, as vacas são ordenhadas três vezes ao dia: às 4h, ao meio-dia e às 19h, e produzem, em média, cerca de 40 litros de leite por dia.

A vida produtiva de uma vaca costuma se estender por cerca de sete anos.

Um dos principais custos da atividade está na alimentação. Cada vaca consome, por dia, cerca de 35 quilos de silagem, 12 quilos de ração e 500 gramas de suplemento mineral.

Do bem-estar à produtividade

A propriedade de Naisser é uma das fazendas-modelo da Jornada Flora, iniciativa de agricultura regenerativa criada pela Danone há cinco anos.

No projeto, os produtores recebem visitas periódicas e diagnósticos sobre nutrição, manejo, sanidade e bem-estar animal.

Há ainda outros programas que incluem parceria com grandes empresas do setor, como o Comquali, desenvolvido com a MSD Saúde Animal, e o Fazenda Tudo de Bem, voltado à eficiência produtiva.

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Segundo dados da companhia, as propriedades participantes reduziram em 43% as emissões de gases de efeito estufa desde 2020. O resultado superou parte das metas previstas para 2030.

Além disso, a renda líquida média dos produtores aumentou 59% no período, segundo a Danone, com impulso dos ganhos de eficiência e produtividade.

A companhia também subsidia parte da assistência técnica, que representa a maior parcela dos custos dos projetos: até 70% no caso de pequenos produtores e 30% para os maiores.

Fazenda Santa Rosa em Ilicínea (MG)

Dos 235 fornecedores ativos da empresa, 167 participam de pelo menos um dos programas.

“Temos iniciativas de sustentabilidade espalhadas por toda a cadeia: nas fábricas, com redução do consumo de energia e de água; no transporte, com rotas otimizadas e equipamentos mais eficientes; e também em ações de redução de emissões de CO₂”, disse Mário Rezende, vice-presidente de Operações e Sustentabilidade da Danone.

“São projetos que exigem investimento e esforço, mas que trazem um payback claro em eficiência e desempenho ao longo de toda a cadeia de produção”, disse.

A companhia francesa pretende apresentar o case brasileiro do Jornada Flora na COP30, em Belém, em novembro, como exemplo de agricultura regenerativa aplicada à pecuária de leite.

Crédito e tecnologia no campo

Um dos principais gargalos do agro é o acesso ao crédito agrícola.

Para apoiar a disseminação das práticas regenerativas no campo, a empresa firmou parceria com o Banco do Brasil nos últimos anos, que já concedeu R$ 175 milhões em crédito rural com juros subsidiados desde 2023.

O valor beneficia 150 produtores da empresa por meio de investimentos que vão de galpões compost barn a equipamentos de ordenha.

Para o ano safra 2025/26, a empresa reservou juntamente ao BB o montante de R$ 100 milhões para seus produtores – dos quais R$ 20 milhões já foram utilizados.

O tempo médio de liberação do crédito é de uma semana, já que os contratos estabelecidos com os produtores garantem a compra integral do leite pela Danone.

Outros parceiros estratégicos incluem o Sebrae, com o programa Educampo, que consiste no treinamento em gestão, nutrição e manejo; a Ajinomoto e a DSM, que desenvolvem aditivos alimentares para reduzir emissões entéricas de metano.

Fazenda Santa Rosa em Ilicínea (MG)

Segundo a Danone, as fazendas do Educampo crescem 50% mais que a média de produtores de Minas Gerais.

Na Fazenda Santa Rosa, há outras práticas regenerativas em curso. É o caso do esterco das vacas, que é revirado diariamente e transformado em adubo e vendido a cerca de R$ 400 a tonelada. O resíduo líquido das baias é reaproveitado para irrigar as plantações de milho e café.

A fazenda também adota o plantio direto, com cobertura vegetal e caixas de contenção para sólidos, práticas que reduzem erosão, economizam fertilizantes e preservam a vida microbiana do solo.

Naisser Pinheiro também cultiva café e emprega dez funcionários na fazenda, onde combina lavoura e pecuária em 100 hectares.

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