O Nepal nomeou Sushila Karki, ex-presidente do Supremo Tribunal do Nepal, como líder de um governo interino na sexta-feira, após a revolta causada pela repressão sangrenta aos protestos que derrubou o primeiro-ministro.
Sushila Karki, de 73 anos, a primeira mulher a ocupar o cargo de presidente do Supremo Tribunal no país, tem reputação de enfrentar a corrupção em uma sociedade marcada por desvios.
Dias de protestos, desencadeados na semana passada pela proibição das redes sociais, refletiram a raiva generalizada acumulada ao longo dos anos no Nepal contra a corrupção oficial e a desigualdade econômica.
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O número de mortos nos protestos subiu para 51, incluindo manifestantes, policiais, presos e outros, disse um porta-voz da polícia na sexta-feira. Ataques incendiários deixaram prédios governamentais em ruínas, e o exército patrulhava a capital, Catmandu, enquanto cidadãos limpavam os destroços.
Liderados por adolescentes e jovens adultos, os protestos foram os mais amplos no Nepal desde que o país se tornou uma república democrática em 2008. Líderes de fato do movimento, que se autodenominam geração Z, se reuniram com oficiais militares nesta semana e disseram apoiar Sushila Karki, conhecida como ativista anticorrupção.
Quem é Sushila Karki?
Sushila Karki, 73 anos, não apenas enfrentou a corrupção, mas também construiu uma reputação de desafiar o establishment político. Ela tem defendido os direitos das mulheres e servido de inspiração para jovens advogadas e juízas.
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Menos de um ano após assumir o cargo, dois dos partidos governistas do Nepal tentaram seu impeachment após ela decidir revogar a nomeação do governo para o cargo de Inspetor Geral da Polícia. A tentativa, que a ONU classificou como “motivada politicamente”, foi abandonada após pressão pública.
Muitos nepaleses, especialmente os ativos no movimento de protesto da geração Z, reclamam que um pequeno grupo da elite consegue acumular riqueza e vantagens para seus filhos.
Sushila Karki disse a um canal de notícias indiano que aceitaria o cargo porque “esses jovens meninos e meninas me pediram, solicitaram”.
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O que aconteceu durante os protestos?

Os protestos começaram na segunda-feira em Catmandu e outras partes do país e cresceram rapidamente. Na capital, os manifestantes acusaram a polícia de abrir fogo contra multidões de jovens que se dirigiam ao complexo do parlamento e bloqueavam rodovias.
Após um dia de confrontos mortais, o governo revogou na terça-feira a proibição das redes sociais que havia provocado a revolta popular. Mas essa medida pouco ajudou a acalmar os protestos.
Online, os manifestantes da geração Z pediam uns aos outros que permanecessem pacíficos. Mas algumas pessoas nas ruas causaram destruição ao romper barricadas, saquear comércios e incendiar escritórios do governo, o Supremo Tribunal e residências de políticos. Eles queimaram o Singha Durbar, sede do governo nepales, e danificaram aeroportos e hotéis.
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Até terça-feira, o primeiro-ministro e quatro outros ministros haviam renunciado. Naquela noite, o general Ashok Raj Sigdel, chefe do Exército nepales, apareceu em um vídeo curto pedindo calma nas ruas.
Seus soldados assumiram o controle às 22h, e os protestos violentos começaram a diminuir à medida que oficiais do exército começaram a dialogar com os líderes do movimento.
Mais de 1.600 pessoas ficaram feridas.
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O que levou aos protestos?

A proibição das redes sociais foi o estopim. Na semana passada, as autoridades nepalesas proibiram 26 plataformas de redes sociais, incluindo WhatsApp, Facebook, Instagram e WeChat, após o prazo para que as empresas cumprissem novos requisitos de registro junto ao governo expirar.
A proibição gerou temores de que a liberdade de expressão pudesse ser restringida para os 30 milhões de habitantes do Nepal e prejudicar o turismo. O bloqueio nas redes sociais também cortou a comunicação de cerca de 2 milhões de trabalhadores nepaleses no exterior com suas famílias. A economia do Nepal depende fortemente das remessas desses trabalhadores.
Os manifestantes, que não têm um líder único, se descrevem como a voz da geração Z do Nepal, que está indignada com a corrupção, o desemprego e a desigualdade.
Nas semanas que antecederam a violência, a hashtag #nepokids começou a ser tendência no Nepal em postagens que mostravam os estilos de vida luxuosos dos filhos da elite política em um país onde a maioria dos jovens luta para sobreviver.
A indignação estava enraizada em problemas sociais e econômicos que vinham crescendo há anos, com o emprego como questão central. A maioria dos nepaleses trabalha sem empregos oficialmente registrados, principalmente na agricultura. E o desemprego está concentrado entre os jovens adultos.
Sem encontrar oportunidades em casa, mais de mil jovens deixam o país todos os dias para cumprir contratos de longo prazo em países ricos em petróleo do Golfo Pérsico e na Malásia. Dezenas de milhares trabalham na Índia como trabalhadores migrantes sazonais. Dados do governo mostram que mais de 741 mil pessoas deixaram o país no ano passado, principalmente para trabalhar na construção civil ou na agricultura.
O restante do Nepal depende fortemente das remessas enviadas por esses trabalhadores no exterior. Em 2024, os US$ 11 bilhões enviados representaram mais de 26% da economia do país.
c.2025 The New York Times Company
Fonte: Info Money