(FOLHAPRESS) – Às vésperas do live-action de “Lilo & Stitch”, que chegou ao Brasil em maio, os cinemas foram tomados pelo alienígena azul e pela garotinha havaiana. No verso de alguns anúncios, porém, a Disney escondeu outra dupla intergaláctica, ainda inédita -o garoto Elio e a adorável minhoca Glordon, um dos extraterrestres que povoam a nova animação da Pixar.
Apesar do sucesso que o ET malcriado da Disney têm conquistado -o remake de “Lilo & Stitch” já é a maior bilheteria do ano no Brasil-, é incomum que crianças implorem para serem abduzidas. Mas essa é justamente a trama do novo desenho, que estreia nesta quinta-feira (19) nos cinemas, após sofrer uma série de adiamentos e mudanças de rota.
Após a morte dos pais, o menino Elio tem de morar com sua tia Olga, uma aspirante a astronauta que trabalha numa agência militar americana. Ao se encantar com uma exposição sobre os mistérios do espaço, ele encontra uma alternativa e passa a sonhar com a vida fora da Terra.
Cercado pelo luto e pela dificuldade em fazer amigos, Elio tenta de tudo para chamar a atenção de seres de outros planetas. Quando atinge seu objetivo, é tomado por embaixador espacial e precisa manter as aparências.
Mesmo com obstáculos, a jornada do garoto não é tão atribulada quanto à do próprio projeto. Anunciado pelo estúdio em 2022, o filme surgiu como ideia pessoal de Adrian Molina, codiretor de “Viva: A Vida é uma Festa” -vencedor do Oscar de melhor animação, o desenho esteve no posto, em 2017, de maior bilheteria na história do México. O cineasta conduzia seu primeiro longa e o trailer inicial flertava com um tom melancólico, onde Elio, na verdade, tinha medo de ser abduzido.
Meses mais tarde, passada a extensa greve de roteiristas de Hollywood, o protagonista deixou de ser o único estranho no ninho. A produção não poderia ser lançada em 2024, já que o ano ficaria reservado a “Divertida Mente 2”, que se tornou, por alguns meses, a animação com maior bilheteria de todos os tempos. Isso até outra continuação, o filme chinês “Nhe Za 2”, tomar esse posto, ainda que o fenômeno da Pixar ainda lidere no mercado americano.
À sombra do desempenho morno de “Elementos”, primeiro original da Pixar a chegar aos cinemas no pós-pandemia -foi a pior estreia da empresa em bilheteria-, o controle criativo de “Elio” foi repassado, enquanto o filme ganhava ares mais lúdicos. Nesse meio-tempo, Molina caiu fora da nave, sob o pretexto de assumir a direção de “Viva 2”, previsto para 2029.
“‘Elio’ é extremamente inspirado na trajetória de Molina. Ele cresceu numa base militar e sempre se sentiu fora de lugar, como se algo não estivesse funcionando. Isso foi algo que buscamos preservar ao máximo: a incapacidade de compreender os outros”, afirma a diretora Madeline Sharafian, que já havia trabalhado com o animador e procurou manter as raízes do colega, cujo nome permaneceu nos créditos, mas com menos destaque.
“Ele é descendente de latino-americanos e nós queríamos reforçar sua cultura”, diz a diretora, reforçando que este é o primeiro protagonista de ascendência mexicano-dominicana da empresa. “A casa de Elio é repleta de itens sutis e seus diálogos com Olga são maneiras de homenageá-la. A equipe ainda contou com muitos profissionais latino-americanos e fizemos questão que, nas cenas espaciais, Elio compartilhasse suas tradições com os outros.”
Anterior ao atual governo de Donald Trump -cuja Hollywood tem se retraído em manifestações críticas- “Viva” explora o Día de Los Muertos e faz da mitologia mexicana parte essencial do roteiro. Mesmo “Elementos”, que não obteve a mesma fama, faz diversas metáforas sobre a imigração.
“Elio”, por sua vez, mira em uma narrativa mais ecumênica, criando uma espécie de ONU alienígena em que todas as espécies entendem as línguas umas das outras. “Quando vou aos parques e vejo pessoas gostando dos filmes que fizemos, a esperança é que criamos algo que pode fazer qualquer um se sentir visto”, diz Sharafian.
Ela herdou “Elio” ao lado de Domee Shi, que esteve à frente de “Red: Crescer é uma Fera”, de 2022. A comédia estrelada por uma jovem que se transforma em panda-vermelho também surgiu da infância de sua idealizadora, que nasceu na China e se mudou cedo para o Canadá.
Ao lado de “Soul” -último longa da Pixar a conquistar a estatueta dourada- e “Luca” -lido à época como alegoria homossexual-, o longa foi o terceiro de uma seleção de originais lançada diretamente no Disney+, quando as salas de exibição se recuperavam dos sintomas da Covid-19.
Fosse pelas temáticas, fosse pelo uso de estilos visuais levemente diferentes, muitos viram um certo frescor na dita fórmula Pixar. Ancorados em universos pessoais, essas produções alinharam mundos fantásticos aos dilemas internos, despreocupadas com vilões tradicionais ou consequências em grande escala que imortalizaram projetos como “Wall-E”, “Ratatouille” e “Toy Story”.
Nem por isso se tornou seguro investir em abordagens inéditas para as telonas. Embora sua presença nunca desvie a atenção dos problemas enfrentados por Elio, o ameaçador Lorde Grigon, alien general com um potente arsenal de armas, é um dos exemplos que andou pela corda bamba.
Se no primeiro trailer ele foi apresentado como membro do conselho intergaláctico, a versão final o transformou em antagonista. A reescrita encena sua redenção, mas o personagem remete à velha batalha do bem contra o mal e reforça um tom mais ingênuo.
Em paralelo aos códigos militares apresentados pelo filme -em determinado momento, Elio é enviado a um acampamento com ares de internato-, é curioso que a disputa com a criatura maligna aponte um discurso desarmamentista. No espaço, o comentário parece bem-vindo. Na Terra, é necessário pisar em ovos.
Por outro lado, Sharafian explica que as novas empreitadas oferecem processos maleáveis. A criação de universos e rostos inéditos autoriza amplas possibilidades para remanejar roteiros e outras decisões criativas. Ela afirma que a Pixar procura equilibrar continuações e originais em seu calendário.
Para 2026, o estúdio prevê o quinto capítulo da saga de brinquedos conscientes, anunciado na ressaca de “Divertida Mente 2”, e “Cara de Um, Focinho de Outro”, animação com pessoas que viram castores. 2027 será o ano de “Gatto”, desenho com estilo à mão centrado num gato preto -como “Flow”, projeto independente que levou o prêmio da Academia em março- e outro “Os Incríveis” deve chegar até 2028.
Com “Elio”, as expectativas são menos agitadas. Encarecido pelos contratempos e orçado em cerca de US$ 300 milhões, o filme deve abrir com pouco mais de US$ 30 milhões nos Estados Unidos. É um valor muito distante dos US$ 183 milhões que receberam Stitch em seu final de semana de estreia.
No Brasil, o desenho, que ainda se aproximou das férias de julho ao desviar do novo “Como Treinar o Seu Dragão”, chegará com divulgação tímida e menos sessões que o colega da Disney. A decisão é estranha. Não é como se lhe faltassem potenciais bichos de pelúcia para dividir a estante com o ET azul.
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ELIO
– Quando Estreia nesta quinta (19) nos cinemas
– Classificação Livre
– Produção Estados Unidos, 2025
– Direção Domee Shi, Madeline Sharafian e Adrian Molina
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Fonte: Notícias ao Minuto