A oncologia brasileira, e global, vive um dos seus momentos mais dinâmicos e promissores. Longe da imagem de um desafio enfrentado com ferramentas limitadas, a medicina oncológica de hoje se assemelha mais a uma orquestra finamente afinada, onde cada instrumento – cada terapia, cada diagnóstico – é escolhido e executado com precisão e carinho para uma melodia única: a vida plena de cada paciente.
Por muitos anos, a abordagem ao câncer foi, por necessidade, mais generalista. Pacientes eram classificados em grupos amplos, e os tratamentos seguiam protocolos padronizados. Embora eficazes em muitos casos, essa abordagem, por vezes, não conseguia abraçar a complexidade e a individualidade de cada tumor e, mais importante, de cada ser humano em sua jornada.
É aqui que reside a verdadeira revolução que testemunhamos. Impulsionada por uma compreensão cada vez mais profunda da biologia tumoral, a oncologia moderna transcendeu a mera classificação do tipo de câncer. Hoje, nosso foco está nas características genéticas e moleculares únicas de cada tumor e, intrinsecamente, de cada paciente. Essa jornada de descoberta nos levou ao desenvolvimento de terapias-alvo e imunoterapias que agem com uma especificidade antes inimaginável, cuidando das células cancerígenas com precisão e, consequentemente, minimizando os efeitos colaterais e otimizando os resultados, sempre com o bem-estar do paciente em mente.
Costumo dizer que estamos desenhando terapias que são como uma “chave sob medida” para cada tumor. Essa metáfora ilustra perfeitamente a essência da medicina de precisão. O paciente deixou de ser um número em uma estatística para se tornar o protagonista de sua própria história de cuidado. As decisões são construídas em conjunto, o diálogo é constante e acolhedor, e a abordagem é intrinsecamente mais humana e empática.
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É fundamental entender que o tratamento oncológico não é uma receita de bolo. Cada paciente é um universo particular, e é por isso que devemos tratá-lo de forma individualizada. Essa personalização do cuidado nos permite não apenas otimizar a resposta à terapia, mas também, por exemplo, descobrir com maior precisão se o paciente é recidivo, agindo de forma proativa e assertiva.
Essa mudança de paradigma não é apenas sobre tecnologia e ciência; é sobre a redefinição do papel do médico e de toda a equipe de saúde. Não somos mais apenas prescritores de tratamentos, mas sim guias, parceiros e orquestradores de um plano de cuidado que abraça a singularidade de cada indivíduo, sua história, seus valores e seus desejos. Ser oncologista é tocar a vida das pessoas, e nosso papel vai muito além de apenas medicar. A qualidade de vida, os objetivos pessoais e o bem-estar integral do paciente tornaram-se elementos tão cruciais quanto a erradicação da doença, porque entendemos que o cuidado vai muito além da cura.
É um privilégio refletir sobre o caminho percorrido e o futuro promissor que se desenha. A pesquisa continua avançando em ritmo acelerado, desvendando novos alvos terapêuticos e aprimorando as ferramentas de diagnóstico. A inteligência artificial, a análise de grandes volumes de dados e a biotecnologia estão convergindo para nos oferecer insights sem precedentes sobre a doença e as melhores formas de cuidar de quem a enfrenta.
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A era da medicina de precisão não é apenas uma promessa; é uma realidade que oferece esperança renovada a milhões de pacientes com câncer. É a certeza de que, juntos, com ciência, humanidade e inovação, estamos construindo um futuro onde o câncer é cada vez mais uma doença tratável, e a vida, em sua plenitude, é sempre o nosso maior objetivo, celebrado em cada passo da jornada.
*Amândio Soares é oncologista e presidente do Grupo Orizonti.